Officia poetae na poética clássica: dinâmicas entre docere, delectare e commovere em Aristóteles e Horácio
Nome Completo:
Pietro Dri Marchiori
Unidade da USP:
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
Programa de Pós-Graduação:
Letras Clássicas
Nível:
Mestrado
Resumo:
A pesquisa investiga o problema das funções ou finalidades da literatura segundo o pensamento antigo (à época, sempre dita "poesia"), centrando-se em Aristóteles (Atenas, 384-322 a.C.) e Horácio (Roma, 65-8 a.C.), partindo de seus tratados de poética. Eles parecem lidar de modos diferentes com as três mesmas funções, que são as mesmas que Cícero (Roma, 106-43 a.C.) propõe para a oratória: instruir, deleitar ou emocionar o ouvinte. Horácio prioriza as duas primeiras, e Aristóteles a última. Porém, normalmente se pensa que Horácio teve bases em Aristóteles, o que torna estranho que tenham focos opostos. Além disso, em outras obras, Aristóteles propôs essas três funções para a música e para a oratória, sem priorizar nenhuma, o que mostra que as três estão em jogo desde ele, passando por Cícero, até chegar em Horácio. Para entender o que está por trás da constância desta tríade de funções desde Aristóteles até Horácio, o trabalho investiga (1) seus conceitos de poesia ou literatura (pois, se tivessem ideias diferentes de "poesia", naturalmente veriam as suas funções de modos diferentes), (2) como mais exatamente entendem essas três funções segundo o conjunto de suas obras e não só os tratados de poética e (3) o contexto histórico que leva a questão de um a outro. Concluiu-se que havia desde pelo menos Aristófanes (447-385 a.C.) e Platão (427-347 a.C.) uma discussão sobre se a literatura deve educar ou dar prazer (onde o dar prazer subentende o emocionar), e que neste problema Aristóteles propôs a solução de uma tríade (separando prazer e comoção) onde as três funções estão sempre em jogo e se influenciam entre si, porém cada uma é priorizada em determinadas circunstâncias (educação é para os jovens, prazer para descansar, emoção para o lazer digno e culto). Mas esta solução passou despercebida ou rejeitada pela crítica literária, e pela crítica literária é que a discussão chegou a Horácio, para quem o poeta pode educar, dar prazer ou fazer ambos. Ainda assim, elementos de Aristóteles chegaram a Horácio através de Cícero, pois Cícero se baseou em Aristóteles quando pouquíssimos o faziam, o que gerou algumas semelhanças entre eles e a aparência de que um teria bases no outro, quando não tem: Horácio se baseia na tradição da crítica, tem outro conceito de poesia e outra visão de suas funções. A pesquisa mostra que desde a Grécia se discute este problema que ainda discutimos hoje em teoria literária (i.e., se a literatura deve edificar ou dar prazer), e que, como mostrou Aristóteles, podemos estar debatendo sobre uma falsa dicotomia, já que a experiência da literatura é muito complexa e provê compreensões, prazeres e comoções que estão interligados - um ponto que passa despercebido nessas discussões, que não compreendem o pensamento de Aristóteles por não analisarem o conjunto de suas obras. Compreender isto, bem como o funcionamento de tais relações internas, pode afetar profundamente a forma com que a literatura é vista e livros são escritos hoje.